[Black Metal em Curitiba] dos anos 1990 até a atualidade – Parte 2: Década de 1990

Na primeira parte, esse artigo foi desenvolvido acerca das origens do Black Metal em Curitiba nos anos 1990, com duas bandas: Amen Corner e Murder Rape; sendo discutido seu início com bases no Death Metal, desenvoltura sonora relacionada ao Doom Metal e estética própria.

Ao que concerne à análise lírica, a Murder Rape define caracterização do Cristianismo como uma moralidade que não possuiria respaldo na natureza humana, já que seríamos homens caídos e afastados de qualquer divindade, pagantes em um inferno. A ignorância é o próprio cristianismo, que tenta colocar os homens como diferentes de si mesmos, em um tipo de moralidade específica e artificial, saindo de uma individualidade na constituição moral do homem.

Em contraposição, a Amen Corner utilizava-se de temas religiosos de forma blasfêmica. Os filhos de Caim, além de menção a toda a história que a banda teve, até mesmo o nome deles, relaciona-se ao ponto de utilizar da religião católica contra ela mesma (Amen Corner significa confessionário).

Amen Corner com o EP “The Final Celebration”.

Percebem-se letras muito mais carregadas de elementos linguísticos como metáforas e analogias, listando noções mitológicas, fatores pouco desenvolvidos pelas bandas no gênero (Celtic Frost era uma das poucas a fazer essas relações nas letras). Com os álbuns lançados, tanto o Amen Corner quanto o Murder Rape realizaram shows na região.

Em 1994, a Amen Corner lançou o EP “The Final Celebration”, pela Cogumelo Records, relançando as duas músicas do Single de 1993 mais duas músicas novas, “Diabolic Possession” e “The Five Glories”.

Com a repercussão do “Celebration of Supreme Evil”, Agathodemon rompe amigavelmente com a Cogumelo Records e funda seu próprio selo, Evil Horde Records, o qual lançou o segundo álbum do Murder Rape, intitulado “…and Evil Returns”, em 1996.

A Evil Horde Records tornou-se um dos principais selos especializados em música extrema no Brasil e na América do Sul, fazendo trocas com várias gravadoras de renome no underground mundial. Também lançou importantes nomes do Black Metal, caso dos dois primeiros álbuns da banda paulistana Ocultan (“Bellicus Profanus” e “Lembranças do Mal, a Crucificação”), os finlandeses do Azaghal (“Helvetin yhdeksän piiriä” e “Of Beasts and Vultures”), entre outros.

Segundo álbum da Amen Corner.

O álbum “Jachol ve Tehilá“, de 1995, foi outro marco da Amen Corner. Similar ao  “Fall, Ascension, Domination”, houve um desenvolvimento claro, comparado ao anterior, em questões musicais, líricas e de produção. Uma base mais melancólica foi desenvolvida ao longo das músicas, aproveitando bem aspectos do Black Metal, Doom e Heavy Metal tradicional, fator que o colocou com um dos clássicos do gênero no Brasil.

Em 1996, Azarack entra na Murder Rape na função de segundo guitarrista, ano que é lançado o “…and Evil Returns”. Similar ao “Celebration of Supreme Evil”, quanto à composição e tempos lentos e médios, a banda começou a desenvolver uma estética mais próxima ao que era feito na Europa.

A sonoridade é um pouco mais suja comparável ao antecessor, mas uma característica interessante concerne ao uso de teclados, o que também estava presente no primeiro álbum; o que aproxima neste aspecto com os cariocas da Songe d’enfer, banda de Black Metal ativa na mesma época. O uso de teclados está atrelado à busca de construir uma atmosfera específica nas músicas, o que foi bastante explorado pelas bandas de Black Metal escandinavas no mesmo período.

Infelizmente, após o lançamento do “…and Evil Returns” e “Jachol ve Tehilá”, ambas as bandas tiveram modificações nas suas formações, impossibilitando lançar álbuns entre 1996 e 2000 (exceção para o EP “Darken in Quir Haresete”, lançado em 1999 pela Amen Corner).

Murder Rape: Line-up de 1996.
EP “Darken in Quir Haresete” de 1999.

Após as saídas de M. Flach e Paulo Costa da Amen Corner, ocorre um período de buscas por novos músicos, resultando em um lapso de dois anos até a consolidação de uma nova formação. Dois músicos de Santa Catarina entraram na banda, Osculum Infame e Cléio, além do curitibano Total War Naberus Erthal, possibilitando a realização de shows na região.

Em 1999, é lançado o EP “Darken in Quir Haresete” pela Demise Records, mas com Nar Mattarus na função de baixista (ele era vocalista e baixista na banda de Death Metal, Imperious Malevolence, na época). Já que houve alterações na formação do grupo, a EP possui algumas características distintas em comparação ao “Jachol ve Tehilá”, caso que pode ser constatado pela maior simplicidade de riffs e estrutura musical, além de uma maior experiência com efeitos e atmosfera.

Outro valor interessante, concerne a todos os membros usarem Corpse Paint. Tal registro indica uma época de mudanças e dificuldades claras na busca de músicos de Black Metal no estado e região.

Posteriormente ao lançamento deste EP, Sucoth Benoth sai da Amen Corner para criar o Camos, uma banda de Black Metal fundada em 2000. Tal acontecimento paralisou as atividades da Amen Corner entre 2000 e 2003.

“Evil Shall Burn Inside Me Forever”, terceiro álbum da Murder Rape.

No caso da Murder Rape, sucedem duas mudanças na formação. Primeiramente, a saída do vocalista Sabatan em 1997, assim como as de Azarack e Ichthys Niger em 1999. Ocorre a busca por músicos e a entrada dos catarinenses Nargothrond no vocal (atualmente na Posthumous e Somberland) e Dagorlad na bateria (baterista da Posthumous na época), formação que lançaria o terceiro álbum, intitulado “Evil Shall Burn Inside Me Forever”.

Este álbum representa uma virada forte na sonoridade do Murder Rape, as características que eram puxadas tanto do Doom Metal quanto do Death Metal dão lugar para o vocal rasgado e influenciado pelas bandas de Segunda Onda, além da bateria rápida de Dagorlad, com uso de Blast Beats.

Os riffs já exploravam tempos mais rápidos em comparação aos álbuns antecessores. Este é um dos registros mais conhecidos e divulgados da Murder Rape, já que foi executado em muitos shows e aberturas de bandas importantes nos anos de 2000.

Por volta do mesmo período, nos anos de 1990, existiram outras bandas na cena curitibana, caso de Solalethiel, Fyhad e Morthem.

Solalethiel consistia em um Black Metal com a sonoridade similar a Amen Corner e Murder Rape, com riffs puxados ao Doom Metal, tempos lentos, além de vocal gutural rasgado. Uma de suas músicas, intitulada “In Memorian Profanan et Enomatheia”, esteve na coletânea “Satanachia Vol.2” lançada pela Satanachia Productions de Portugal, no ano de 1994.

Morthem (1992).

Morthem foi formado em 1992 por Julio Bona (Death Chaos), Chrystian Mass (ex-Offal, ex-Axecuter) e Paulo A., sob os pseudônimos: Ddo Haaleiyn, Pentacolu Hataenaetus Male Volentyys e Zyrchhadieh Neogghamn.

Capa da demo de 1993.

A banda existiu até o ano de 1994, lançando uma demo intitulada “In the wood he reign”, a qual explorava uma sonoridade de lento e médio tempo, bastante influenciada pelo Death/Doom do período. Esteticamente, pode ser considerada como uma banda de segunda onda pelo uso de Corpse Paint, ambientação em florestas, além de nunca realizarem shows.

Fyhad foi formada no ano de 1992, sendo uma banda de Black Metal influenciada por bandas de segunda onda norueguesa, como Mayhem, Darkthrone e Satyricon. Mesmo possuindo 6 músicas, não chegaram a gravar uma demo.

A banda formada por alguns músicos importantes da cena curitibana, como Azarack (ex-Murder Rape, ex-Evilwar), Ottavio Lourenço (ex-Necrotério, Choke), Gustavo Bertassoni, Marcos e José Neto, realizou alguns shows em 1994. A sonoridade apresentada pela banda possuía similaridades com Amen Corner e Murder Rape.

No final dos anos 1990 e início dos 2000, houve uma expressiva mudança na cena curitibana. De dois expoentes nascem várias outras bandas, exprimindo diversas influências e vertentes do Black Metal.

Esse período será tratado detalhadamente a partir do próximo post. Por enquanto, aproveite para deixar um comentário e nos siga no Facebook e no Instagram.

Confira todas as partes:

3 thoughts on “[Black Metal em Curitiba] dos anos 1990 até a atualidade – Parte 2: Década de 1990

  1. LEANDRO FERNANDES says:

    Excelente a sua pesquisa ,nos faz refletir sobre uma história sensacional onde o underground Brilhou nas terras geladas !

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